Por Pe. Almir Magalhães*
O título desta reflexão se refere ao capítulo IV
da Exortação Apostólica alegrtia, (Evangelii Gaudium em latim) do Papa
Francisco, de 24/11/13. Partilho aqui de algumas ideias do referido texto. Temos
hoje um cenário de Igreja hegemônico, que basicamente descarta a presença
pública da Igreja, a questão social e é marcado por um perfil eminentemente
pós-moderno ou de uma sociedade líquida, como queiram. O texto do Papa é uma
ajuda para a mudança de rumos.
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Ressalte-se que este capítulo compreende mais de
sessenta páginas, ficando evidente que farei escolhas, em função do espaço que
me é permitido.
O Papa evidencia que a proposta do Evangelho não
consiste só numa relação pessoal com Deus e que nossa resposta de amor também
não deveria ser entendida como uma mera soma de gestos pessoais a favor de
alguns indivíduos necessitados, o que poderia constituir uma “caridade por
receita”, uma série de ações destinadas apenas a tranquilizar a própria
consciência. A proposta é o Reino de Deus (cf. Lc. 4,43)… na medida que Ele
conseguir reinar entre nós, a vida social será um espaço de fraternidade, de
justiça, de paz, de dignidade para todos. Por isso, tanto o anúncio como a
experiência cristã tendem a provocar consequências sociais. (cf. EG, n.180).
Já é de domínio público que o Papa Francisco tem
um estilo de se expressar com simplicidade e objetividade. Penso que ele levanta
uma questão interessante e que toca profundamente este perfil predominante do
modo de ser Igreja, quando afirma que “Já não se pode afirmar que a religião
deve limitar-se ao âmbito privado e serve apenas para preparar as almas para o
céu mas que Deus deseja a felicidade de seus filhos também nesta terra e que
Deus criou todas as coisas para “nosso usufruto”( I Tm 6, 17) e que todos possam
usufruir delas. Por este motivo, a conversão cristã exige rever “especialmente
tudo o que diz respeito à ordem social e a consecução do bem comum”(cf. EG n.
182).
Ora, esta é justamente a análise que
pastoralistas e sociólogos da religião fazem hoje: temos um modo de expressar a
religião de modo intimista, privado, “eu e meu Deus” numa direção verticalista,
esquecendo-se do que se passa ao seu redor, das relações com o próximo, não
importando-se com a relação fé x vida.
Não por acaso as últimas diretrizes da Igreja no
Brasil, Doc. 94 da CNBB, afirmam: que o discípulo missionário observa, com
preocupação, o surgimento de certas práticas e vivências religiosas,
predominantemente ligadas ao emocionalismo e ao sentimentalismo, busca-se a
própria satisfação, prescinde-se do bem maior, o amor de Deus e o serviço aos
semelhantes. (Cf. Doc. 94 da CNBB, n. 22). Na mesma linha o Papa Emérito no
discurso de abertura da Conferência de Aparecida chamou a atenção para o
significado de santidade, afirmando que ela não é fuga para um intimismo ou
individualismo religioso, tampouco o abandono da realidade urgente dos grandes
problemas econômicos, sociais e políticos da América Latina e do mundo, e muito
menos fuga da realidade para um mundo exclusivamente espiritual (cf. DAp n. 148
e Discurso Inaugural do Papa n. 3).
No documento que estamos refletindo, Papa
Francisco alerta para o fato de que “ninguém pode exigir-nos que releguemos a
religião para a intimidade secreta das pessoas, sem qualquer influência na vida
social e nacional sem nos preocupar com a saúde das instituições da sociedade
civil, sem nos pronunciar sobre os acontecimentos que interessam aos cidadãos…
uma fé autêntica – que nunca é cômoda nem individualista – comporta sempre um
profundo desejo de mudar o mundo, transmitir valores, deixar a terra um pouco
melhor depois de nossa passagem por ela” (EG n. 183).
Finalizando, tudo isto nos leva a refletir sobre
a vida é ameaçada, negada, desrespeitada e banalizada e, neste sentido o
capítulo 25 do Evangelho de Mateus é o horizonte, o gabarito para o “vestibular
final” que começa aqui e agora e nos permite dizer que os aplausos ao Papa
Francisco, frutos de seus pronunciamentos acompanhados de gestos e de
testemunhos, são um momento muito especial para nós cristãos e a Igreja, pois se
nós temos ouvidos para ouvir, então ouçamos o que o Espírito de Deus diz às
Igrejas (cf. Apocalipse, 2,7.11.17.29; 3, 6.13.22).
*Almir Magalhães é padre da Arquidiocese de
Fortaleza e diretor da Faculdade Católica de Fortaleza.
Artigo publicado no Jornal O Povo
em http://www.opovo.com.br/app/opovo/espiritualidade/2014/03/15/noticiasjornalespiritualidade,3220775/a-dimensao-social-da-evangelizacao.shtml
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