por Padre Geovane Saraiva*
A aparição do argentino Jorge Mario Bergoglio, na
sacada da Praça de São Pedro, aos 13 de março de 2013, foi uma grande e
agradável surpresa. O arcebispo de Buenos Aires foi eleito papa e escolheu o
nome de Francisco, o santo da paz e dos pobres, para governar os destinos da
Igreja Católica, carregando consigo marcas de crises profundas.
Permita-me querido leitor falar de paz interior e
exterior, tão bem compreendida por Francisco de Assis, redescoberta no Papa
Francisco, a qual foi por ele encarnada, quando humildemente se apresentou ao
mundo. Foi a mesma graça salvadora de Deus que se manifestou a todos os homens
no natal (cf. Tt 2, 11), na imanência da encarnação que entrou no seu interior,
encantando-o e fascinando-o, a ponto de ter o que ofertá-la a humanidade, como
um dom indizível e inexprimível.
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Numa época conturbada, assemelhando-se a vivida
por Francisco de Assis, eis que surge o fermento de renovação dentro da Igreja;
fermento novo, no mundo da economia, da política e do social onde o dinheiro e o
lucro não devem se impor como o eixo e a mola mestra, naquilo de mais nobre e
elevado em detrimento do valor da vida humana, imagem e semelhança de Deus.
É por isso mesmo que na sua mensagem para o dia
Mundial da Paz, 1º de janeiro deste ano de 2014, Francisco ajuda-nos, propondo
uma reflexão, no sentido de se redescobrir a fraternidade na economia como
condição sine qua non para se atingir o grande sonho do Pai, manifestado no
Menino que nos foi dado, no qual nos deparamos como o mistério da vida em
plenitude, tornando-nos filhos de Deus e irmãos uns dos outros.
O Papa Francisco diz com todas as letras em sua
mensagem de paz, que a corrupção e o crime organizado são antagônicos a
fraternidade, que é o fundamento e o caminho da paz. Como é belíssimo e coerente
o testemunho humanitário de José Pepe Mujica, na Revista espanhola “Econimist”,
indicando a verdadeira direção da paz, vindo do presidente do Uruguai, quando
indagado sobre a possível indicação ao Prêmio Nobel da Paz, na seguinte
assertiva: “Seria uma honra para os humildes e empobrecidos do nosso país. Temos
muitas mulheres que vivem sozinhas com quatro ou cinco filhos, porque os maridos
as abandonaram e lutamos para que elas possam ter uma casa digna (…) e penso que
só assim esse Prêmio Nobel da Paz teria sentido”.
Francisco de Assis experimentou à Igreja, no
tempo do Papa Inocêncio III. Tempo de muito poder e de muito fausto. Faziam-se
sentir diversos movimentos de renovação a partir da realidade, fundamentalmente,
marcada pela pobreza. Infelizmente, tais movimentos queriam conseguir o seu
objetivo colocando-se à margem daquele que ao encarnar, revelou o rosto
terníssimo do Pai, na condição de Supremo Pastor e por Ele enviado. É exatamente
no contexto semelhante a esse que Deus nos mandou o Papa Francisco, que em sua
plenitude, se colocou como servo dos servos de Deus, num grande desejo de paz ao
dialogar com as realidades, seja a pessoa humana, seja a realidade do planeta no
seu conjunto.
Ao iniciar o ano de 2014, celebramos o dia
mundial da paz, tendo no nosso interior, o Cântico das Criaturas, de Francisco
de Assis que se extasiava diante de Deus, o qual com o coração cheio de ternura
costumava chamar a Deus de Bom Senhor, Altíssimo, Sumo Bem, Único Bem e todo o
Bem. E o que sentia tornava-se oração. Convém ler e meditar as orações que
brotaram espontâneas, desta alma toda repleta da mais excelsa misericórdia do
Senhor, da transcendência de Deus, tão assimilada nos gestos e nas atitudes do
nosso querido Francisco, Vigário de Cristo na terra.
Francisco de Assis viveu numa época marcada por
ambiguidades. Hoje, mais do que nunca, é necessário que a fraternidade seja
redescoberta, amada, experimentada, anunciada e testemunhada; mas só o amor dado
por Deus é que nos permite acolher e viver plenamente a fraternidade. Precisamos
ter diante dos nossos olhos e no nosso coração a paz duradoura, que tem origem
no nosso Deus, grande, imenso e divino em sua ternura. Na obediência da fé e da
bondade de um Deus pobre, dizendo-nos que só quem tem o coração despojado,
assemelhando-se a Ele, totalmente aberto ao seu amor misericordioso, é capaz de
compreendê-lo e levar uma vida a partir desta realidade misteriosa.
Com a chegada do novo Sucessor de Pedro, o
planeta foi alegremente contemplado, porque através dele os cristãos passaram a
se sentir estimulados e fomentados a um grande compromisso de dialogar e cuidar
da criação, nas suas mais diversas realidades. É o mundo que precisa
carinhosamente de práticas ecológicas e ambientais, nas quais a humanidade possa
se tornar cada vez mais viva e coerente com aquilo que a professa e
acredita.
Um belo e maravilhoso exemplo veio da gaúcha Ana
Paula Maciel, integrante do Greenpeace Internacional, ao desembarcar no dia 28
de dezembro de 2013, após 100 dias de prisão na Rússia, ao dizer: “Eu não
poderia falar em final feliz, enquanto o Ártico continuar derretendo, a Amazônia
sendo reduzida e os oceanos sendo envenenados. Eu tomei uma atitude e assumi os
riscos por enxergar a urgência de mudar os rumos da humanidade. Há muito
trabalho pela frente e precisamos de toda a ajuda possível dos que se importam e
acreditam em nosso trabalho”.
Saibamos compreender que é imprescindível a luta
pela paz do mundo, na grandeza divina, envolvida em sua misteriosa pequenez,
revelada “naquele que era rico e se fez pobre para nos enriquecer na sua
pobreza” (2Cr 8, 9).
Que em 2014, a partir do estímulo e da grandeza
do seu principal artífice, nosso querido Papa Francisco, a paz seja constante no
planeta, contando com o diálogo e a generosa colaboração de todos os credos e
religiões. Assim seja!
*Padre da Arquidiocese de Fortaleza, escritor,
articulista, blogueiro, membro da Academia Metropolitana de Letras de Fortaleza,
da Academia de Letras dos Municípios do Estado Ceará (ALMECE) e Vice-Presidente
da Previdência Sacerdotal – Pároco de Santo Afonso – geovanesaraiva@gmail.com
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