As opções feitas pelo Papa Francisco na
sua primeira performance como
“criador” de cardeais são cheias de sugestões,
não somente pelos nomes selecionados. Também aqui se revela o modus operandi do
atual sucessor de Pedro que manifesta a sua percepção da natureza da
Igreja.
Segunda, 13 de janeiro de 2014
A reportagem é de Gianni Valente e publicada
por Vatican Insider, 12-01-2014. A tradução é de IHU
On-Line.
Respeito às regras
No seu primeiro consistório como bispo de Roma, Papa
Francisco optou por se ater às regras em vigor para a criação de novos
cardeais: supera somente em um o limite dos 120 cardeais com menos de 80 anos e,
portanto, com direito de voto num eventual Conclave. A regra foi, por exemplo,
varias vezes não cumprida por João Paulo II que, no Consistório
de 2001 elevou o número de cardeais com menos de 80 anos ao recorde de 135
cardeais.
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As três nomeações curiais vão para os chefes de três dicastérios. A eles se
acrescenta Lorenzo Baldisseri, chefe de um organismo – a
secretaria geral do Sínodo – que não pertence ao organograma curial.
O Sul bate o Norte por 9 a 3
Dos novos cardeais com direito a voto, a maioria absoluta (9 de 16) provêm da
América Latina, Ásia e África.
Se nas próximas criações cardinalícias Papa
Bergoglio prosseguir nesta linha prospectiva, pode-se imaginar um
progressivo emagrecimento percentual dos cardeais italianos e dos curiais.
Presidentes de futuros dicastérios vaticanos que no passado tiveram um cardeal
deverão se contentar com a ideia de serem colaboradores do Papa sem entrarem no
Colégio Cardinalício.
Mais pastores, menos bispos-teólogos
Há um outro reequilíbrio na nomeação dos primeiros cardeais
por Bergoglio que não é somente geográfico. Muitos dos novos
purpurados eleitores, antes de ser ordenados bispos, foram párocos por longos
períodos das suas vidas: é o caso, por exemplo, de Philippe
Ouèdraogo, novo cardeal de Burkina Faso, e do
arcebispo de Seul, Andrew Yeom soo-jung, descendente de um dos
mártires coreanos.
O salesiano chileno Ricardo Ezzati Andrello e o cisterciense
brasileiro Orani João Tempesta trabalharam por muito tempo nas
realidades pastorais e educativas ligadas às suas respectivas congregações. O
canadense Gérald Cyprien Lacroix, membro do Instituto Secular
Pio X (do qual foi diretor geral) e sucessor do
cardeal Ouellet na arquidiocese de Quebec, viveu uma
experiência missionária, por nove anos, na Colômbia. Também o
inglês Vincent Nichols, antes de ser bispo, foi pároco e
trabalhou em instituições dedicadas à formação pastoral. O único teólogo
‘profissional” é – por força das coisas – o alemão Müller.
As escolhas são eloquentemente pessoais
Em muitos dos consistórios do passado também recente, não era difícil
adivinhar as pressões exercidas por setores eclesiais ou homnes fortes da Cúria
que determinavam as listas dos novos cardeais. Desta vez, isto não aconteceu.
Respeitando firmemente as regras canônicas, Papa Francisco fez, sem timidez,
pessoalmente as escolhas.
Com algumas escolhas quis enviar algumas mensagens fortes e fáceis de serem
decifradas, em plena consonância com as palavras e a compreensão de Igreja que
ele tem expressado no seu magistério cotidiano.
Assim, a escolha de Chibly Langlois, 55 anos, que será o
primeiro cardeal do Haiti, a ilha-santuário de todas as contradições e
sofrimentos latino-americanos. E o segundo cardeal “votante” das Filipinas no
atual Colégio – Orlando Beltran Qevedo – vindo de Mindanao, a
ilha mais pobre e martirizada do arquipélago filipino. A púrpura conferida ao
arcebispo de Perugia Gualtiero Bassetti – recentemente nomeado
para a Congregação dos Bispos – representa também a enésima mensagem enviada
pelo Papa Francisco ao episcopado italiano.
Nenhuma diocese do mundo é “cardinalícia” por natureza
Papa Bergoglio sabe distinguir entre costume eclesiástico e
Tradição. Ele sabe que nenhuma diocese no mundo é “cardinalícia” por estatuto
divino ou por definição do direito canônico. Algumas opções feitas neste
consistório – como a inclusão na lista do arcebipo
de Perugia (onde o último cardeal nomeado remonta aos tempos do
Estado Pontifício) e a simultânea ausência de sedes diocesanas
como Turim e Veneza – sem se submeter às
regras não escritas de “que sempre foi assim” (Evangelii
gaudium, no. 33).
Rompendo com este automatismo Begoglio de um lado, desarma,
em parte, o frênesi de pessoas e grupos eclesiásticos que organizam e pressionam
para ‘garantir’ alguém ‘fidelíssimo’ nas arquidiocesess consideradas até agora
‘seguras’ e desta maneira garantir o seu acesso no Colégio Cardinalício. Além
disso, se freia a perversão clerical que subdivide as dioceses em classes de
prestígio. Aquela concepção mundana em que são classificadas as dioceses de
“status baixo”, donde ser bispo equivaleria a uma “diminutio” ou, às vezes, a
uma punição.
Ao contrário, do ponto de vista sacramental, o bispo de qualquer ilha perdida
do Pacífico tem a mesma plenitude do sacerdócio como o cardeal arcebispo de
Milão ou de Paris. Todos os três são iguais e são chamados a servir o povo de
Deus com a mesma solicitude. A Igreja de Cristo funciona assim, E o Papa
Francisco busca mostrá-lo em cada gesto e em cada decisão que toma.
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