“Mesmo
agora que sou papa me sinto ainda um sacerdote”. Esta foi uma das passagens do
diálogo que o papa Francisco teve, na manhã desta segunda-feira, 16 de setembro,
com os sacerdotes da diocese de Roma, durante encontro na Basílica São João de
Latrão. O Santo Padre foi acolhido pelo cardeal Vigário de Roma, Agostino
Vallini, que na sua saudação comentou que este encontro foi programado por
Francisco logo após ter sido eleito.
“O que é o cansaço para um sacerdote, para um
bispo e mesmo para o bispo de Roma?” O papa Francisco desenvolveu o seu
pronunciamento introdutivo, detendo-se neste questionamento. E confiou que a
inspiração lhe veio após ler a carta enviada por um sacerdote idoso, que
justamente lhe falava sobre este cansaço, um “cansaço no coração”. “Existe –
disse o papa – um cansaço do trabalho e isto todos conhecemos. Chegamos de
noite, cansados de trabalhar e passamos diante do Tabernáculo para saudar o
Senhor. Sempre – advertiu – é necessário passar pelo Tabernáculo”:
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“Quando um sacerdote está em contato com o seu
povo, se cansa. Quando um padre não está em contato com o seu povo, se cansa,
mas mal e para dormir deve tomar um comprimido, não? Ao invés disso, aquele que
está em contato com o povo – que de fato o povo tem tantas exigências, tantas
exigências! Mas são as exigências de Deus, não? – este cansa realmente e não tem
necessidade de tomar comprimidos”.
Existe, porém, um “cansaço final” – prosseguiu
Francisco – que se vê antes do “crepúsculo da vida” no qual “existe a luz escura
e o escuro um pouco luminoso”. É “um cansaço que vem no momento em que deveria
existir o triunfo”, mas ao invés disto “vem este cansaço”. Isto – afirmou –
acontece quando “o sacerdote se questiona sobre sua existência, olha para trás,
ao caminho percorrido e pensa nas renúncias, aos filhos que não teve e se
pergunta se não errou, se a sua vida “falhou”. É justamente sobre o “cansaço do
coração” de que o sacerdote escrevia na carta.
O papa citou o cansaço em tantas figuras
bíblicas, de Elias a Moisés, de Jeremias até João Batista. Este último, afirmou,
na “escuridão da prisão” vive o “escuro de sua alma” e manda os seus discípulos
perguntarem a Jesus se Ele é realmente aquele que estão esperando. O que pode
fazer então um sacerdote que vive a experiência de João Batista? Rezar, “até
dormir diante do Tabernáculo, mas estar ali”. E depois “procurar a proximidade
com os outros padres, e sobretudo, com os bispos”.
“Nós, bispos, devemos ser próximos aos
sacerdotes, devemos ser caridosos com o próximo e os mais próximos são os
sacerdotes. Os mais próximos do bispo são os sacerdotes. Vale também o
contrário! O mais próximo dos padres deve ser o bispo, o mais próximo. A
caridade para com o próximo, o mais próximo é o meu bispo. O bispo diz: os mais
próximos são os meus padres. É bonita esta troca, não? Isto, acredito, é o
momento mais importante da proximidade, entre o bispo e os sacerdotes: este
momento sem palavras, porque não existem palavras para este cansaço”.
Diálogo
A partir deste ponto, iniciou-se o diálogo do
papa Francisco com os sacerdotes, aos quais pediu para sentirem-se livres para
perguntar qualquer coisa. Respondendo à primeira pergunta, Francisco disse que
no serviço pastoral, não deve se “confundir a criatividade com fazer alguma
coisa nova”. A criatividade – afirmou – “é buscar o caminho para que o Evangelho
seja anunciado” e isto “não é fácil”. Criatividade “não é somente mudar as
coisas”. É uma outra coisa, vem do Espírito e se faz com a oração e se faz
falando com os fiéis, com as pessoas. O Papa, então, recordou uma experiência
vivida quando era Arcebispo de Buenos Aires. Com um sacerdote, disse, procurava
entender como tornar a sua igreja mais acolhedora:
“Ah, se passa tanta gente aqui, talvez seria
bonito que a igreja ficasse aberta durante todo o dia…Boa ideia! Também seria
bonito que tivesse sempre um confessor à disposição, ali…Boa ideia! E assim
foi”.
Esta – acrescentou – é uma ‘corajosa
criatividade’. Também em relação aos cursos em preparação ao Batismo “é
necessário superar o obstáculo dos pais e das mães que trabalham toda a semana e
no domingo gostariam de repousar”. Então, é necessário “buscar novos caminhos”,
como uma “missão no bairro” promovida pelos leigos. E esta é a “conversão
pastoral”. A Igreja, “também o Código de Direito canônico nos dá tantas, tantas
possibilidades, tanta liberdade para buscarmos estas coisas”. É necessário –
destacou – procurar os momentos de acolhida, quando os fiéis devem ir à paróquia
por um motivo ou outro. E criticou severamente quem, numa paróquia, está mais
preocupado em pedir dinheiro por um certificado que pelo Sacramento e assim
“afastam as pessoas”. É necessário, ao invés disto, “a acolhida cordial”: “que
aquele que venha à igreja se sinta como na sua casa. Se sinta bem. Que não se
sinta explorado”:
“Um sacerdote, uma vez – não da minha Diocese, de
uma outra -, me dizia: ‘Mas, eu não faço pagar nada, nem mesmo as intenções da
Missa. Tenho ali uma caixa e eles deixam aquilo que querem. Mas Padre: tenho
quase o dobro do que tinha anteriormente. Porque as pessoas são generosas, e
Deus abençoa estas coisas’.
“Se, ao invés disto, a pessoa vê que existe um
interesse econômico, então se afasta”, observou Francisco. O Papa então,
respondeu a quem lhe perguntava como ele se define agora, visto que, como
Arcebispo de Buenos Aires, gostava definir-se simplesmente como ‘sacerdote’:
“Mas, eu me sinto padre, é sério. Eu me sinto
padre, sacerdote, é verdade, bispo…Me sinto assim, não? E agradeço ao Senhor por
isto. Teria medo de sentir-me um pouco mais importante, não? Isto sim, tenho
medo disto, pois o diabo é esperto, eh!, é esperto e te faz sentir que agora tu
tem poder, que tu pode fazer isto, que tu podes fazer quilo… mas sempre girando,
girando em volta, como um leão – assim diz São Pedro, não! Mas graças a Deus,
isto não perdi, ainda, não? E se vocês virem que eu perdi isto, por favor, me
digam e se não puderem me dizer privadamente, digam publicamente, mas digam:
‘Olha, converta-te!’, porque está claro, não?”
Após, o Santo Padre falou sobre os sacerdotes
misericordiosos. Um padre enamorado – disse – deve sempre recordar-se do
primeiro amor, de Jesus, “retornar àquela fidelidade que permanece sempre e nos
espera”. Para mim, isto é “o ponto-chave de um sacerdote enamorado: que tenha a
capacidade de voltar à recordação do primeiro amor”. E acrescentou: “uma Igreja
que perde a memória, é uma Igreja eletrônica: não tem vida”. Assim, é necessário
guardar-se dos padres rigorosos e negligentes. O sacerdote misericordioso –
afirmou – é aquele que diz a verdade mas acrescenta: “Não te apavores, o Deus
bom te espera, Caminhemos juntos”. A isto acrescentou: “devemos tê-lo sempre sob
os olhos: acompanhar. Ser companheiros de caminho”. “A conversão sempre se faz
assim – disse – a caminho e não no laboratório”.
“A verdade de Deus é esta verdade, digamos assim
dogmática, para dizer uma palavra, ou moral, mas acompanhada do amor e da
paciência de Deus, sempre assim”.
“Na Igreja – acrescentou – existem certos
escândalos mas também tanta santidade e esta é maior. E existe também esta
“santidade cotidiana”, escondida, “aquela santidade de tantas mães e de tantas
mulheres, de tantos homens que trabalham todo o dia pela família”. Palavras
estas acompanhadas de um encorajadora convicção:
“Eu ouso dizer que a Igreja nunca esteve tão bem
como hoje. A Igreja não cai: estou seguro disto, estou seguro!”
O papa então, voltou ao tema das periferias
existenciais, retomando as suas palavra sobre “conventos vazios” e a
generosidade para com os mais necessitados. Por fim, refletiu sobre o tema da
família, e em particular, sobre a delicada questão da nulidade dos matrimônios e
sobre as segundas uniões. “Um problema – recordou – que Bento XVI tinha no seu
coração”. “O problema não pode ser reduzido à questão do fazer a comunhão ou não
– afirmou – porque quem coloca o problema somente nestes termos não entende qual
é o verdadeiro problema”.
“É um problema grave – observou – de
responsabilidade da Igreja em relação às famílias que vivem esta situação”. A
Igreja – afirmou ainda – neste momento deve fazer alguma coisa para resolver os
problemas das nulidades matrimoniais. Um tema sobre o qual falará com o grupo
dos 8 Cardeais que se reunirão nos primeiros dias de outubro, no Vaticano. E
será tratado também no próximo Sínodo dos Bispos, pois é uma verdadeira
“periferia existencial”.
Por fim, o papa Francisco recordou que no próximo
21 de setembro celebrará o 60º aniversário de sua vocação ao sacerdócio.
POR:
CNBB / RÁDIO VATICANO
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