Quando se caracteriza o que vem ocorrendo no
Brasil e o que nos fez a grande vitrine do que vem acontecendo na América
Latina, afirma-se que o país está fazendo um acerto de contas com seu passado de
profundas desigualdades na medida em que efetiva com sucesso um modelo de
desenvolvimento que combina crescimento e inclusão social. É esse modelo que
explicaria os avanços consideráveis no nível social, econômico e político. O
modelo de fato considera o crescimento econômico a condição insubstituível para
a consecução da inclusão social.
Para atingir esse objetivo, tido como a meta que
deve reger toda a ação governamental, adotou o modelo de crescimento típico da
Segunda Revolução Industrial, produtivista e consumista. Neste horizonte se
justificam fortes investimentos em matrizes energéticas altamente poluidoras,
devastadoras do meio ambiente e mesmo altamente questionáveis, como a energia
nuclear que ainda persiste como meta, financiamentos da exploração de madeiras e
minérios, expansão da pecuária e das monoculturas da soja e da cana de açúcar,
portanto, da expansão das commodities que exercem grande pressão sobre os
recursos naturais e têm provocado uma reprimarização da economia brasileira
refletida claramente na pauta de exportações.
Um elemento fundamental desse projeto é a ideia
que o Estado deve ser o indutor do crescimento, mas não o seu gestor, o que
significa que o Estado financia os recursos necessários e depois entrega o ativo
ao capital privado, como se vê no caso das concessões de rodovias, ferrovias,
portos e aeroportos.
O outro lado da medalha é a inclusão social: o
modelo erradica a miséria e a pobreza, levando milhões de pessoas à classe
média. O elemento novo estaria na combinação exitosa entre o social e o
econômico, que desmascarou a convicção hegemônica de que não seria possível
associar políticas de inclusão social, de distribuição de renda ao crescimento
econômico e isso num regime democrático.
Foi isso que levou o Ipea a declarar a última
década como a “década da inclusão”. Isso se mostra no fato de que entre 2001 e
2011 a renda per capita dos 10% mais pobres subiu 91,2% enquanto a dos 10% mais
ricos, 16,6%, o que está associado aos programas de transferência de renda e ao
aquecimento do mercado de trabalho.
Algumas vozes se têm levantado não no sentido de
ignorar as conquistas alcançadas, mas de chamar atenção em primeiro lugar para a
necessidade de debater em profundidade o modelo econômico e, em segundo lugar,
de perguntar se essa inclusão social via mercado responde plenamente à grande
questão de fundo, que é a efetivação dos direitos das grandes maiorias.
O sociólogo Sérgio Costa é de opinião que as
ações do governo não tocam em alguns elementos estruturais da desigualdade no
Brasil e as medidas escolhidas não garantem em longo prazo a ascensão das
classes mais baixas. Um bom exemplo para ilustrar a tese: frequentando escolas
públicas ruins, os mais pobres são condenados a permanecer em sua condição de
classe.
Por Manfredo Araújo de Oliveira, filósofo e
professor da UFC. / manfredo.oliveira@uol.com.br
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