Ser uma pessoa é ter uma história para contar
Mensagem para a festa de São Marcelino Champagnat,
Durante os
últimos meses, passaram por nossa Casa geral, em Roma, diversos grupos
de peregrinos maristas, depois de visitarem nossa casa de l’Hermitage.
Tive ocasião de encontrar-me com a maioria desses grupos e pude
constatar o grande impacto que produziu, em suas vidas, o contato com os
lugares de nossas origens maristas. Muitas pessoas perguntam-se com
admiração, quando se encontram fisicamente nesse vale estreito e úmido,
banhado pelo rio Gier, como foi possível uma expansão internacional tão
grande do Instituto Marista, a partir desse humilde lugar. Acredito, no
entanto, que é ainda mais marcante reconhecer-se parte da maravilhosa
história, começada, em 1817, nessas terras, história que se prolonga até
os nossos dias, nos cinco continentes. Sabemos que somos continuadores
do sonho do Padre Champagnat, do Irmão Francisco, de nossos primeiros
Irmãos e de tantos outros que os seguiram.
Todos nós,
provavelmente, em algum momento, experimentamos essa consoladora
sensação de saber que nossas pequenas histórias conectam com uma
história maior, que se desenvolve ao nosso redor, e da qual podemos ser
parte. Para muitos de nós, efetivamente, resulta quase impossível, hoje,
separar nosso caminho pessoal daquele marista, um a mais, entre tantos
que convergem na grande história da humanidade e que desejam contribuir
para fazer do mundo um lugar de fraternidade e de harmonia.
Parece-me
que esse sentimento está bem expressado na famosa novela de Tolkien: “O
senhor dos anéis”. Frodo e Sam, dois populares hobbits,
encontram-se, sem saber muito bem como e por que, envolvidos,
repentinamente, numa apaixonante aventura. Abandonam a comodidade do que
já é conhecido para enfrentar perigos e contínuas surpresas. Eles ainda
não o sabem, mas têm o papel fundamental de garantir o futuro da “Terra
Média”.
Certa ocasião, ao encontrar-se em perigo, Sam se dirige a Frodo:
-… Gostaria de saber em que história fomos cair.
– Eu
também – disse Frodo – mas não o sei. E assim são as histórias da vida
real. Pense em alguma que você mais gosta. Você pode saber, ou
adivinhar, que tipo de história é, se terá um final feliz ou triste, mas
os protagonistas não sabem absolutamente nada. E você não quereria que o
soubessem.
-… As grandes histórias nunca terminam?
– Não, nunca terminam como histórias, disse Frodo. Mas os protagonistas a elas chegam e se vão, quando cumpriram sua parte…
Creio que
nós, diferentemente de Sam e Frodo, vamos tomando consciência da
história em que “caímos”: uma grande história, dessas que nunca
terminam, na qual queremos assumir nosso protagonismo e “fazer nossa
parte”.
Hoje, quando
celebramos a vida e a santidade de Marcelino Champagnat, é um dia de
ação de graças. Porque nossas vidas pessoais se entrecruzam a serviço de
um projeto maior, que nos supera e nos dá sentido e rumo. Sentimo-nos
chamados a ser uma presença de Maria na Igreja e na sociedade.
No entanto, é
também um dia para renovar nossa adesão ao carisma e à missão maristas,
desafiando todas as nossas resistências a sair depressa, com Maria,
para uma nova terra. Logo mais, vão completar-se dois anos da celebração
do XXI Capítulo geral e os “horizontes de futuro”, intuídos nessa
assembleia, continuam a interpelar-nos com veemência, pedindo
compromissos pessoais e coletivos:
Uma vida consagrada nova, arraigada firmemente no Evangelho, que promova um novo modo de ser Irmão.
Uma nova
relação entre Irmãos, Leigas e Leigos, baseada na comunhão e, juntos,
buscando maior vitalidade do carisma para o nosso mundo.
Uma presença fortemente significativa entre crianças e jovens pobres.
“Gostaria de
saber em que história fomos cair…” Não duvidemos: trata-se de uma
aventura apaixonante, pela qual vale a pena dar a vida. Como atores
dessa história, desconhecemos seu desenlace; pouco importa: sabemos que a
meta é o caminho; isso nos basta.
Caminhemos,
pois, com alegria, esperança e renovado compromisso pelas vias da
história marista, da qual vamos sendo protagonistas. Percorrer esse
itinerário coletivo nos ajuda a sermos mais nós mesmos, porque, como
disse Isak Dinesen: “Ser uma pessoa é ter uma história para contar”.
São
Marcelino Champagnat, cuja estrela procuramos seguir, nos abençoe a
todos, famílias, crianças e jovens que servimos, nos cinco continentes.
Ir. Emili Turú