quinta-feira, 4 de abril de 2013

UGANDA: suspenso padre que contesta o celibato. Porque: “CRIA ÓDIO contra a igreja.”

O celibato dos padres católicos é “mais uma imposição do que uma escolha livre, e seus efeitos não são nada positivos.” Isto foi escrito, preto no branco, pelo Pe. Anthony Musaala, sacerdote ugandês, numa longa carta aberta, enviada em 12 de março aos bispos, religiosos e leigos para sugerir o início de uma reflexão interna sobre o “fracasso do celibato entre os padres diocesanos”, “que poderiam se tornar felizes no casamento, antes ou depois da ordenação, em vez de viverem tristes e sozinhos.”
Uma opinião provavelmente chocante – especialmente para os católicos africanos que tendem a ser conservadores – mas inderrogável: continuar a fazer de conta que o problema não existe só vai causar danos sempre mais graves, continua Musaala, relativos tanto ao sofrimento dos sacerdotes como também às consequências “escandalosas” e criminosas. O ‘”auto-engano”, a negação do problema, explica o sacerdote, pode durar por mais uns dez anos, mas depois muitos escândalos virão à luz e, então, o sistema vai implodir, provocando o abandono da Igreja Católica e a migração de grande parte dos fiéis para outras comunidades de fé “, cujos pastores talvez nem sejam melhores, mas, com certeza, vão parecer menos hipócritas.” Tudo isso em um contexto eclesial de crescente descontentamento, sobretudo entre as classes médias.
Todos, na Uganda, falam sobre os casos amorosos dos sacerdotes, lemos na carta: no cabeleireiro ou no bar, na confissão ou em casa. Trata-se de relações mais ou menos ocultas que os sacerdotes mantêm, fugaz ou permanentemente com paroquianas, garçonetes, estudantes, padres, freiras, e até mesmo religiosos que oferecem sexo em troca de dinheiro.
E – é a nota triste – infelizmente mesmo com menores, sem que na África o escândalo da pedofilia suscite a indignação pública como aconteceu na Europa e na América do Norte. Completa o quadro uma ainda não contabilizada quantidade de filhos espalhados pelo país ou abortado por não “sujar’ a imagem do mesmo padre. “Emerge assim uma grande fraqueza humana – conclui Musaala – com consequências catastróficas tanto para o padre como para os parceiros. Fraqueza que não pode ser escondida atrás de um voto de celibato, orações e rituais. “
É “a verdade nua e crua” que a Igreja na África continua a empurrar, como se fosse poeira, para baixo do tapete, bem representada por alguns “casos” que o Pe. Anthony conta na carta: um rapaz de 21 anos que tentou o suicídio, filho de um padre que finge ser seu tio e que exerce o ministério na Arquidiocese de Kampala; um amigo dele, que nasceu da violência de um pai branco já falecido, que nunca conseguiu superar a injustiça sofrida pela mãe, apesar da compensação financeira da congregação; uma jovem de Kampala Velha, que caiu na miséria e depois foi enganada e engravidada por um padre; uma mulher que se ia confessar apenas para ser acariciada na escuridão do confessionário; finalmente, ele próprio que, muito jovem ainda, descobriu o concorrido mundo do sexo entre os estudantes das escolas católicas. “Casos não são isolados, sintomáticos de um sistema doente que perdeu a sua integridade, mas que nunca vai admitir isso.”

A proposta

Os casos de abuso infantil devem ser tratados com processos legais, da mesma forma que todos os outros crimes, escreve Musaala, lembrando que, entretanto – e, claro, em completa autonomia em relação à Igreja – decidiu criar uma rede de profissionais para apoiar vítimas de pedofilia eclesiástica.
“É necessária – acrescenta – uma campanha de sensibilização pelo celibato opcional”, “já que não há argumentos teológicos”, “mas apenas as restrições de tradição e da disciplina da Igreja”. “Estou ciente do fato de que a luta será dura. Infelizmente, o celibato também serve a alguns interesses na estrutura de poder da Igreja e, claro, para a autoridade eclesiástica, os padres celibatários são menos caros, mais fáceis de gerenciar e até mesmo de manipular.
Eu acho que com o tempo estaremos livres deste jugo inútil e mais grave ainda na África, onde os laços familiares são cruciais para o equilíbrio psicológico das pessoas. “Uma regra, conclui,  removendo uma pedrinha do sapato, que, além do mais, só vale para os padres que não têm poder suficiente para gozarem da cobertura complacente das hierarquias católicas locais.
A resposta
 
Segundo o arcebispo de Kampala, Cyprian Kizito Lwanga – o texto da sua resposta, datada de 19 de março, está disponível no site do jornal ugandês Daily Monitor, 20/3 – a carta do Pe. Anthony Musaala causou grande perturbação entre os fiéis e jogou uma luz ruim sobre a Igreja da Uganda, que sempre foi comprometida com a defesa dos direitos das crianças e dos mais vulneráveis. O celibato é uma obrigação prevista pelo código de direito canônico, mas também pelo juramento do diácono que fez os votos, acrescentou o prelado. Ninguém é forçado a se tornar padre e, portanto, as críticas feitas pelo Pe. Musaala estão incorretas. Além disso, o seu ensino, diz também o arcebispo, “desperta o ódio e o desprezo contra a Igreja”, e portanto “, ele incorre em uma suspensão ferendae sententiae, como prescrito pelo Can. 1314 ‘.
Giampaolo Petrucci
Tradução: João Tavares

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