O artigo que segue
abaixo foi escrito por nosso colega GERARDO
CAMPOS
em 1999 e
publicado no Jornal O POVO.
Continua extremamente atual, lamentavelmente!
NOITE
FELIZ! CUIDADO .....
Meninos
de rua! Ainda hoje, não há lugar para eles. Nem manjedoura ... . Daí o problema
que a sociedade, omissa numa solução pelo amor integrá-los à sociedade o mais
rápido possível, exclamam políticos influentes. Preocupação justíssima a ser
traduzida em atos e com a máxima urgência!
Alguns questionamentos de dimensões
éticas e antropológicas se fazem necessários, para provocar dúvidas capazes de
gerar com o tempo um compromisso libertador!
LEIA MAIS:
Educar os meninos de rua para quê?
Para serem letrados ou para encontrarem sua identidade e se sentirem crianças,
símbolos vivos da simplicidade, da paz interior e da autoconfiança, modelo até
do reino dos céus? ...
Integrá-los a qual sociedade? À
neo-liberal? Totalmente desintegrada, dividida, desigual, injusta, a cavar,
cada dia dentro de si mesma, o abismo do homem e o abismo do pão, onde há
poucos que comem e há muitos que não?! ... Uma sociedade em que se um menor
rouba uma bicicleta a preocupação maior é com o destino da bicicleta e não com
o destino do menor?!
Infelizmente, (é triste para um
educador reconhecer isto) as escolas que existem para elas não lhes satisfazem
as ansiedades. São livres demais para se submeterem a uma grade curricular
..... .
Imagine-se um possível diálogo entre
dois meninos, Um, fardado de azul e branco. O outro, de calção, sujo e rasgado
... . Ambos caminham, lado a lado, na mesma ruela de uma periferia qualquer.
- Ei! Cara, prá onde tu vai?
- Vou prá escola!
- Lá é bom?
- Mais ou menos!
- Como é lá?
- É uma casa grande, cheia
de carteira.
- O que é que tu faz com
tanta carteira, macho?
- Ora, eu me sento prá
estudar.
- Pô! Eu pensava que era
carteira prá gente bater.
- E o que tu ganha
estudando?
- Eu aprendo e tiro nota.
- Vantage! Eu nem estudo e
já aprendi também a tirar nota. - Se tu não tira nota o que acontece contigo?
- Eu levo pau ...
- Pois eu levo pau quando
tiro nota ....
- Mas eu tiro nota para
mudar de classe.
- E cola?
- Às vezes a gente não sabe a lição e um amigo passa cola prá
gente.
- Eu falo é de cola prá cheirar, bicho!
- Essa não! De jeito nenhum! Faz mal!
- E tem festa na tua escola?
- Vez por outra. Semana passada, o Delegado de ensino visitou a
nossa aula. Foi animado. A gente cantou, foi massa.
- Puxa! Tem delegado também na tua escola! Prá que?
- Ele disse que seu interesse é da gente aprender ...
- Vai nessa!Delegado prá mim, só se interessa prá prender a
gente.
O
diálogo prosseguiu.
- Cara, minha sala de aula é
legal! Tem um quadro verde, enorme, na frente.
- O quadro na minha frente é
negro ...
- Sabe o que é chato na
minha escola? É ter dever prá fazer em casa.
- Nada rapaz! Pior que isso,
é ter direitos e não ter casa!
Deixo de imaginar e caio na
realidade.
Como precisa crescer uma sociedade
que por ser conivente com a riqueza e o lucro não aprendeu ainda a conviver com
aqueles que ela mesma exclui de suas circunstâncias!
Meninos de rua não são desalmados.
Foram mal amados. Se são bandidos, é porque foram banidos, muito cedo, de uma
vida humana e digna. Por isso, meu amigo privilegiado, ao sais à rua, na Noite
Feliz, não esqueça aquele sábio e oportuno trocadilho: “Quem ostenta os tenta!”
Gerardo José Campos
MFPC CEARÁ - Falecido
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