ou seja
DEUS PEDE PASSAGEM
O
tempo que antecede à festa de Natal é marcado pela alegria, pela esperança. Somos
cientes de que há de começar algo novo em nossas vidas. Paira no ar uma nova
proposta de vida, um jeito de conviver melhor uns com os outros, como canta
Ivan Lins: “No novo tempo, apesar dos
castigos, estamos crescidos, estamos atentos, estamos mais vivos prá nos socorrer,
prá nos socorrer, prá nos socorrer.” Invade-nos o
desejo de que tudo aquilo que vai contra a vida dê lugar à realização dos
nossos sonhos que sugerem um mundo melhor. Ressoa dentro de nós uma voz que
almeja tranqüilidade, fraternidade, justiça, paz e amor.
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Precisamos,
porém, de serenidade, que possibilite cada um encontrar-se, em primeira
instância, consigo mesmo para, em seguida, juntos nos perguntarmos se estamos
abertos e preparados para o novo, que veio no silêncio e na escuridão da noite,
que “carrega a aurora em seu seio!” (Dom Helder na “Sinfonia dos
dois mundos”). O “novo”, o “não conhecido”,
o “não esperado”, o “surpreendente” caracteriza
profundamente o Natal, isto é, todas as formas de Natal, toda vida nova: o
Natal dos planetas e das estrelas, das ideias, dos pensamentos ou de descobertas,
de seres humanos, animais ou plantas, de sentimentos, emoções ou paixões. E
este novo tem a ver com mudança, que, por sua vez, alimenta esperança. A esperança
origina vida. E esta vida nos diz respeito a nós todos, porque ela nos
relaciona como seres dialogais, complementares e, de forma construtiva,
dependentes uns dos outros. Nisto habita o sentido do nosso ser, a essência da
nossa existência.
Que
aurora do novo então é esta?
Há
um canto natalino na Alemanha (1328), dizendo: “Em doce alegria, cantem agora e sejam alegres, porque o regozijo do
nosso coração encontra-se no presépio e brilha como o sol no colo da mãe: Tu és
Alfa e Omega!” Acho lindo, quando diz: “o regozijo do nosso coração se encontra no
presépio!” Regozijo significa alegria, contentamento, deleite; dá
aquela sensação de termos alcançado o máximo de prazer em nossa vida, a nossa
felicidade deitada numa manjedoura, pequena e frágil ainda, contendo, porém,
uma promessa sedutora.
Esta
aurora e este regozijo têm nome: Jesus. Por certo não há de ser o Jesus que
desaparece debaixo da comercialização “natalina” e cuja voz é abafada pelas centenas
de decibéis estridentes dos vazios “Jingle bells”. O nosso verdadeiro regozijo
está naquele que reconhecemos como o Emanuel, que veio “anunciar a boa nova aos pobres, proclamar a libertação aos cativos, a
recuperação da vista aos cegos, e veio despedir os oprimidos em liberdade e um
ano de acolhimento da parte do Senhor” (Lc. 4, 18.19). Eis a promessa
sedutora.
Esta
promessa foi dirigida, em primeiro lugar, aos pobres de então: os pastores, que
foram os primeiros a ouvir a Boa Nova e a abraçá-la. Mas, de lá para cá, a
Mensagem de esperança continua a ser dirigida, preferencialmente, aos pobres. E
estes pobres têm cara: os que têm fome e sede, os que choram, os perseguidos e
caluniados, os afligidos, as mulheres de sempre; são os samaritanos de então,
os africanos e haitianos de hoje, os leprosos de então, os aidéticos de hoje, a
“prostituta” de então, os homo-afetivos de hoje, os negros e os índios em nosso
país que, conforme opinião de alguns, não somam, e, portanto, atrapalham o “nosso
progresso”; são aqueles a quem era negado o acesso ao templo de então, e os
tantos que são excluídos das “igrejas” de hoje. Pois todos eles não contam para
os que estão na parte superior da pirâmide da sociedade em geral, da política,
do sistema econômico “que mata” (Papa
Francisco), da igreja!
Mas
que ninguém pense estar fora desta Boa Nova! Como Bom Pastor, Jesus estendia
seus braços aos pobres com muito carinho. “pois
eles eram como ovelhas sem pastor” (Mc 6, 34). Nosso irmão Frei Carlos
Mesters nos ensina: “Jesus caminhava com o povo nas romarias, cultivava suas
devoções, esmolas, jejuns e orações (Mt. 6, 2, 18) e, como leigo, participava
das celebrações semanais na sinagoga, levantando-se para fazer as leituras (Lc.
4, 16)” (Em: “Descer da Cruz os pobres”, Paulinas, 2007). Jesus, portanto, se solidarizava com
os pobres, ficando do lado deles e chegou até a dizer-lhes: “Eu te louvo, Pai, Senhor do céu e da terra,
por teres ocultado isso aos sábios e aos inteligentes e por tê-lo revelado aos
pequeninos” (Mt. 11, 25). Todos nós estaremos incluídos na Boa Nova, a
partir do momento em que edificamos nossa vida, solidarizando-nos com os pobres
da terra, abraçando-os com carinho, possibilitando-lhes a chance de construir
vida digna, juntos com eles e a partir deles. Faremos parte da Boa Nova, a
partir do momento e por meio de gestos nos quais “passamos de atitudes fechadas à formação de uma nova cultura, que
constrói cidadania no diálogo e que não tem medo de acolher o que o outro, o
diferente, tem a oferecer” (Estudos CNBB, n.º 148). Estamos dentro da
proposta de Jesus quando criamos a coragem “de
nos considerarmos como que marcados a fogo pela missão de iluminar, abençoar,
vivificar, levantar, curar, libertar.” (Papa Francisco em “Alegria do Evangelho”, n.º 273).
Então
aparece a AURORA em todo seu esplendor e todos nós poderemos dizer: “FELIZ NATAL”,
porque acabamos de abrir a porta do nosso coração e da nossa mente para O NOVO poder
entrar!
Fortaleza,
3 de dezembro de 2014,
Geraldo
Frencken
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